O calor aperta e o corpo já acusa saudade de uma dança. Porém, nos dias que correm, talvez seja necessário um manual de Controle Higiénico Sanitário para o Bailarico. Primeiro passo: relaxar as sobrancelhas, colocar uma bela porção de óleo de coco pelos cabelos e deixar o sol aquecer os joelhos. Segundo passo: escolher um belo sapato ou simplesmente sentir os calos contra o chão. Terceiro passo: Preparar um belo jarro de sumo natural (com umas gotas de bálsamo de Baco). Quarto passo: atirarmo-nos à pista de dança e aproveitar os 5m2 de segurança que agora são necessários para experimentar todos aqueles passos que estavam escondidos nos desejos mais íntimos. Quinto passo: Só parar quando o vizinho não aguentar mais ou até a luz ir abaixo. Aqui ficam 10 escolhas musicais para 10 dias mais, façam bom proveito e sejam felizes!
ARIANNA CASELLAS (Venezuela)
De Arianna, sabe-se que, tal como as canções, o vinho é fundamental à refeição. Um belíssimo indício para quem quer compor para a eternidade. Arianna nasceu na Venezuela, mas vive há alguns anos em Portugal. De um sopro só, vagueamos pelas memórias ora relatadas em português ora entoadas em castelhano, de familiares, personagens e locais. Composições trovadorescas com pitadas de melancolia. As salas de espetáculo que abram para a podermos escutar ao vivo e a cores! Ou talvez a encontremos numa qualquer praia perdida à espera de que as ondas ofereçam as suas palavras ao mar profundo.
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ANN O’ARO (Ilha da Reunião)
O disco de estreia de Ann O´Aro é uma dança serpenteada. Quais encantadores de serpentes de Rajastão. Ann O’Aro é proficiente no que toca às energias ocultas por detrás de um passo de dança reptiliano. Uma vida repleta de acontecimentos atribulados que acabaram por modelar a forma como se deve encantar a vida. Canções cantadas acappella e nada mais é necessário para embelezar as suas poesias. Banhem-se com as suas canções sob um mar de luz lunar.
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MARIA ARNAL i MARCEL BAGÉS (Espanha)
Maria Arnal e Marcel Bagés, uma dupla catalã que rapidamente se tornou num caso sério no mundo da música hispânica ao cantar um presente irremediavelmente colado ao passado histórico da ditadura franquista. Longe das festas de verão, a música do duo é um exercício de purga e catarse para que o presente não nos engane. Há algo de muito antigo neles. Aguardamos ansiosamente pelo que poderá vir aí. Meterão novamente o dedo na ferida? Esperemos que sim.
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MELANIE DE BIASIO (Bélgica)
O mistério, a solidão e a pureza de um simples pensamento, são esculpidos por uma das mais arrebatadoras vozes dos nossos tempos. Comporá rodeada de lobos? As suas canções são cantos hipnóticos que facilmente anulam a gravidade existente. Ao escutá-la, rapidamente descolámos da Terra em direção a qualquer uma das estrelas e planetas que pairam por aí perdidas. Não interessa. Desde que tenhamos a voz da Melanie para nos embalar.
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NATALIA LAFOURCADE (México)
Natalia Lafourcade é a alma cantante que ilumina uma noite de festa em pleno verão. Para o imaginarmos, basta escutar o mais recente disco “Un canto por México Vol.1”, no qual a artista de Veracruz canta apaixonadamente as raízes da sua música e do seu povo. Natalia edita o disco para angariar fundos que irão ajudar na reconstrução do centro cultural da cidade, destruído por um terramoto em 2017. Assim que estiver construído, será carregada pelos braços de todos aqueles da sua cidade e as flores irão colorir as ruas. Viva Natalia, viva a música mexicana!
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PEROTÁ CHINGÓ (Argentina)
Dolores Aguirre e Julia Ortiz são uma bênção da natureza, meticulosamente criadas pelos bosques e rios deste mundo. “MUTA” é um disco fabuloso, editado no final de 2019, impregnado de uma energia contagiante. Ao vivo, contam-se pelos dedos aqueles que não entoam os seus hinos de amor e sabedoria. A capacidade de escrever algo para que todos queiram cantar com todo o sentimento é algo mágico. As Perotá Chingó sabem fazer isso de forma inigualável. Aprenderam com as deusas das florestas a caminhar, sem magoar. “Quiero caminhar, tranquilamente / Camino, tranquilamente”.
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SILVANA ESTRADA (México)
A Silvana Estrada atribui vida às palavras que canta. Nascida em Veracruz, a artista mexicana carrega o instrumento cuatro venezuelano e ergue a sua voz para fazer renascer antigos amores, e quiçá, enterrar outros. Uma das compositoras mais surpreendentes da América Latina que nasceu para amolecer as nossas vidas. Um mergulho no mar e uma canção de Silvana são a receita para um dia de verão perfeito.
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CAIXA DE PANDORA
Não só de discos do século passado se faz a história. A Caixa de Pandora almeja introduzir artistas e discos icónicos que nasceram em anos mais ou menos longínquos. Apresentamos três discos que nos fazem levitar só de ouvirmos os primeiros acordes.
HALLELUJAH CHICKEN RUN BAND, “Take One” (1974-1979)
Thomas Mapfumo, conhecido como o “Leão do Zimbabué”, foi um dos fundadores da Hallelujah Chicken Run Band, contrastando com tudo o que havia feito até então. Deixou de lado as influências ocidentais e mergulhou nas raízes dos povos Shona. Embora este disco apenas tenha sido editado em 2006, pela Analog Africa, a compilação refere-se a composições entre 74 e 79.
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DAVID ZÉ, “Mutudi Ua Ufolo/Viúva da Liberdade” (1975)
“Viúva da Liberdade” é um trabalho poderoso, carregado dos desafios sociais e políticos que Angola viveu durante o período colonial. As suas músicas são autênticas lições de história, que por muitas vezes poderiam não ser tão fáceis ao povo simplificar. David Zé fá-lo a cantar. Palavras que todos devemos ouvir e continuar a ouvir, para que possamos repensar e escutar quem realmente viveu na pele. Tinha apenas 32 anos quando partiu. Mas ficou.
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KANDA BONGO MAN, “Come Kwassa-Kwassa” (1994)
O género musical Soukous, criado nos então Congo Belga e Francês, está para sempre associado à felicidade, à alegria, e aos mais cristalinos solos de guitarra que alguma vez foram compostos. Kanda Bongo Man, nascido no Congo, lembrou-se de fazer mais e de aventurar-se pelas transformações deste género para o que viria a ser conhecido como Kwassa-Kwassa. Uma festa sem soukous, não é festa. Bailem até o sol nascer!
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Imagem de capa por Saliba Douaihy (Seascape, 1950)