A Arte Barroca
Na História da Arte Ocidental, desde a Pré-História até aos inícios do século XX sucedem-se e alternam-se duas correntes artísticas antagónicas: a corrente apolínea (do Deus grego Apolo): racional, geométrica, equilibrada de cores frias e a corrente dionisíaca (do Deus grego Dionísio): de cores quentes, de contrastes de luz, de formas curvas e quebradas e com os espaços totalmente preenchidos numa completa afirmação de horror ao vazio.
Mecenas e encomendadores da obra de arte, artistas e público usufruidor da obra de arte cansados da simplicidade formal e da geometrização, por vezes excessiva da Arte do Renascimento procuram novas soluções através da criação de obras, onde o rigor do cânone é abandonado surgindo criações artísticas à maneira de Miguel Ângelo, Rafael, Ticiano, etc., dando lugar ao Maneirismo do final do século XVII e, três décadas depois ao Barroco. A Arte Barroca é o representante máximo desta corrente dionisíaca.
A Arte Barroca, grosso modo, vai de 1600 até 1750, tem origem em Roma e estende-se por toda a Europa e pelas colónias dos impérios de Portugal e Espanha, nomeadamente na América Latina.
Genericamente, as características essenciais do barroco são as seguintes: na arquitetura, predomínio da planta oval e o gosto pelas linhas curvas e formas agitadas, contextualizadas na monumentalidade, sumptuosidade e efeitos cénicos; no urbanismo, construção de grandes jardins, quase sempre agregados a palácios imponentes, e na criação de fontes.
As cidades tornam-se verdadeiros décors de pedra: há fontes isoladas e não adossadas aos muros e a água é lançada por golfinhos, tritões e outras personagens, tendo como fim adornar as praças das cidades, jardins ou escadarias.
Na escultura, as estátuas revelam grande movimento e há um constante enquadramento de brasões, cartelas, troféus, coroas de flores, fogaréus anjos, santos e a Virgem Maria, quer nas fachadas dos edifícios arquitetónicos, quer na talha dourada dos interiores.
Na pintura são constantes os contrastes violentos entre a luz e sombra, o predomínio de cor sobre delimitação precisa dos contornos. Os salões e igrejas são pintados com cenas arquitetónicas e naturalistas que simulam a continuação da arquitetura real. A chamada decoração em ”trompe l`oeil” (engana olhos). Os tons dramáticos, escuros e violentos, tornam-se cada vez mais claros, teatrais, vivos e alegres.
A arte barroca está indissociavelmente ligada, por um lado, à implantação do Absolutismo Régio, protagonizado na sua expressão máxima por Luís XIV em França e visível no palácio de Versalhes e por outro ao movimento religioso da Contra Reforma Católica. Os padres da igreja católica acreditavam na força de persuasão do Belo, assim a arte parecia-lhes um meio adequado para a “recatolização” pois conseguia cativar emocionalmente os homens.
As igrejas e os palácios foram decorados com enormes frescos, com grandes painéis de azulejo historiado, com talha dourada cujos temas eram principalmente retirados do conjunto de temas postos em causa pelos protestantes. O objetivo é extasiar o cristão através do recurso ao dourado e às cores quentes, às formas curvas e helicoidais, à profusão de imagens e formas no espaço, como que criando um espaço onde o vazio não tem lugar.
No interior das igrejas católicas vai dominar a “Igreja-Salão”, espaço amplo sem as divisões em naves, com os dois púlpitos nas paredes laterais de onde estrategicamente os pregadores católicos através de sermões bem elaborados difundem as orientações do Concílio de Trento. Esta colocação central destes púlpitos cumpre também o objetivo de vigiar, condicionar e intimidar os comportamentos e atitudes dos católicos.
Dos inúmeros artistas da Arte Barroca menciono na arquitetura Vígnola, Bernini, Borromini, Le Vau. Na escultura Bernini. Na pintura Caravaggio, Rubens, Rembrandt, Vermeer, Andrea Pozzo e os pintores espanhóis do “Século de Ouro” (Velasquez, Zurbaran e Murilho).
A Arte Barroca em Portugal
No espaço geográfico de Portugal, desde o início da nacionalidade até às últimas décadas do século XX, os dois estilos artísticos mais marcantes, quer pela sua duração no tempo, quer pela quantidade de obras criadas, quer pela sua difusão em todo o território urbano e rural foram o românico e o barroco.
A Arte Barroca, em Portugal, atingiu o apogeu no reinado de D. João V. Este monarca bafejado pela sorte, graças as enormes e valiosíssimas quantidades de ouro, prata e diamantes vindas do Brasil, bem como à acalmia político militar vigente no seu longo reinado pode ser um grandiosíssimo mecenas. O mecenato direto de D.João V, ou seja, como financiador total da obra, exemplifica-se nas seguintes obras: Convento-Palácio de Mafra, Igreja do Menino de Deus em Lisboa, Capela de S. João Batista, na Igreja de S. Roque em Lisboa, Capela-Mor da Sé de Évora e a Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra.
Mas este mecenato do rei estendeu-se praticamente a todo o reino através da doação de avultadas verbas a congregações religiosas e igrejas paroquiais, quase todas elas adornadas com rica talha dourada e azulejo historiado. D. João V promoveu também a ida de artistas bolseiros portugueses, nomeadamente para Roma e ainda a contratação de artistas estrangeiros, destacando de entre estes Juvara, Ludovice, António Canevari e Luigi Vanvitelli.
Esta intervenção tão intensa, avassaladora e duradora do rei, na Arte Barroca, criou um modelo artístico, composto por talha dourada em associação com o azulejo historiado azul e branco, claramente português dentro do barroco designado “Estilo Nacional”.
No norte de Portugal, mais especificamente na região do “Grande Porto” o artista barroco marcante e criador de “uma escola” foi Nicolau Nasoni. Este italiano com formação académica em cenografia vem para o Porto, em 1725, a convite do deão da Sé do Porto. A estadia foi definitiva e deste artista saiu o desenho e a construção da Igreja e Torre dos Clérigos, fachada da Igreja da Misericórdia, Galilé da Sé, Palácio do Freixo, Palácio de S. João Novo na cidade do Porto. Fora, desta cidade, a Igreja do Senhor de Matosinhos e o Solar de Mateus em Vila Real.
A Arte Barroca em Braga
Braga, a “Capital do Barroco” em Portugal, teve no século XVIII quatro homens fundamentais para o impulso construtivo da arte barroca, nomeadamente na arquitetura e escultura, quer em pedra quer em talha dourada. Foram eles os arcebispos D. Rodrigo de Moura Teles (1704-1728), D. José de Bragança (1741-1756) e D. Gaspar de Bragança (1757-1789) que, como mecenas, idealizaram e financiaram várias obras arquitetónicas, urbanísticas e escultóricas. E o artista bracarense André Soares (1720-1769).
André Soares foi um predestinado para as artes, nomeadamente para a arquitetura e talha dourada. Este bracarense foi um autodidata artístico, já que fez toda a sua aprendizagem, nesta cidade, em contacto com tratados de arquitetura, gravuras e desenhos existentes nas principais livrarias conventuais do Minho e na biblioteca do Paço dos Arcebispos.
Entre as suas obras destacam-se a Igreja de Santa Maria da Falperra (1753-1755), Casa da Câmara (1753), Palácio do Raio (1754) e Igreja dos Congregados (1761). Com estas obras a sua arquitetura ganhou o estatuto de “arquitetura de autor”. A feliz coincidência de André Soares ter sido um génio, simultaneamente na arquitetura e na escultura, as fachadas, dos seus edifícios, têm uma tridimensionalidade, uma capacidade tal do domínio e criação do espaço envolvente que não estava ao alcance da maioria dos arquitetos.
Não é possível escrever sobre o barroco em Braga sem fazer referência ao Santuário do Bom Jesus do Monte. Este modelo de santuários é de inspiração italiana, da região de Turim e insere-se dentro do objetivo propagandístico da Contrarreforma da Igreja Católica.
O mentor/mecenas deste santuário foi o Arcebispo D. Rodrigo de Moura Teles em 1722 que decidiu empreender a reconstrução do pequeno santuário já existente no local. O conjunto inicia-se com um pórtico na base do monte, do qual parte uma alameda, subindo em ziguezague a ligar as várias ermidas com os passos da via-sacra, pontilhada de fontes com símbolos astrais.
Esta alameda desemboca no monumental escadório de grande efeito panorâmico com lanços convergentes e divergentes, animados de jarras decorativas, estátuas e fontes simbólicas. Este conjunto terminava numa igreja de planta elipsoidal que foi demolido, mais tarde, para dar lugar à atual igreja, obra de outro artista bracarense que deixou marcas na arquitetura portuguesa, na 2ª metade do século XIX, o engenheiro Carlos Amarante.
O Barroco, a sua expressão no Mundo e em Braga, pelo Prof. José Paulino Castanheira, licenciado em História da Arte pela FLUP.