Dois milénios de história tornam Braga uma das cidades mais antigas de Portugal.
Fundada como Bracara Augusta, no tempo dos romanos, ao longo destes tempos, muitas são as estórias, lendas e mitos criados em volta da cidade que ainda hoje despertam a curiosidade de muitos.
1. A história dos Galos Casamenteiros
Quem passa pelo Largo de Sta Cruz depara-se diariamente com pessoas paradas, nariz virado para o ar, em frente à fachada da Igreja de Santa Cruz. Contudo, o que poderia parecer um comportamento pouco normal e até perigoso face aos nossos amigos voadores, tem uma explicação bem simples e romântica.
Segundo reza a história, existem três galos na fachada barroca da igreja e a “moça casadoira” que os encontrar, tem casamento assegurado em breve.
Contudo, não se pense que a tarefa é assim tão fácil. Se os dois primeiros galos são “canja”, a descoberta do terceiro é um quebra-cabeças “Einsteiniano”. O processo pode ser moroso e até frustrante. Mas essa dificuldade não é vista como um fator dissuasor mas antes um requisito que antecede o matrimónio.
2. São Longuinho de Braga
As histórias e tradições que têm em comum a figura de São Longuinho são muito variadas.
Alguns referem que São Longuinho foi um dos soldados que presenciou a crucificação de Jesus Cristo e que, perante esse episódio, se decidiu converter. Na tradição popular, (ao ponto de já ter merecido um sketch do grupo humorístico brasileiro Porta dos fundos) o S. Longuinho é invocado aquando da necessidade de auxilio na procura por objetos perdidos. Para a cidade de Braga, a estória “que nos traz cá hoje” é outra.
2.1. A Lenda
Segundo reza a lenda, Longuinhos, um lavrador abastado e com grande reputação, residia nas redondezas da cidade de Braga. Quando passava cavalgando, fazia com que todos o olhassem, intimidando os homens e apaixonando as mulheres, principalmente as jovens donzelas à procura de um excelente partido.
Apesar de toda a atenção, nenhuma lhe despertava particular interesse até ao dia em que conheceu Rosinha, uma bonita donzela filha de Pedro, um lavrador materialista. Perdido de amores, Longuinhos, não teve meias medidas e decidiu pedir a jovem em casamento, na esperança de viver um casamento eterno e feliz.
Porém, o coração de Rosinha já pertencia a outro rapaz, Artur, que diante do altar do Bom Jesus, lhe havia prometido casamento.
Com receio de perder o bom negócio, o Pai de Rosinha, rude e sem escrúpulos, arranjou forma de aterrorizar a filha, de tal forma que esta acabou por ceder.
Durante noite e dia, sempre muito chorosa, Rosinha orava e apelava no seu quarto a São João: “Oh meu bom, meu querido, S. João, salva-me, por favor! Faz um dos teus milagres! Ficar-te-ei eternamente grata!”.
Muitos dias de choro, orações e penar, Rosinha ouviu uma voz que lhe disse: “Eu conseguirei que não faltes ao juramento que fizeste”. Ao mesmo tempo, a mesma voz terá sussurrado a Longuinhos apelando à sua compaixão pela felicidade de Rosinha.
Longuinhos acedeu e disse a S. João que se Rosinha amava outro jovem, ele não tinha o direito de destruir a felicidade do casal. Além disso acrescentou: “Se me consentes, São João, eu próprio serei o padrinho desse casamento! Sei que precisam de um bom começo de vida e eu encarregar-me-ei disso. Quanto ao meu amor, cá o entreterei até que se desvaneça”.
De imediato, o Santo avisou Rosinha que estava na hora de começar a preparar a sua boda com Artur, pois padrinho já tinha. Quem ficou a perder, foi Pedro, que num ato egoísta, quase tinha conseguido trocar a felicidade da sua filha pelo seu bem-estar.
Assim, a figura de Longuinhos também vive na estátua de S. Longuinho, e simboliza o altruísmo e o triunfo, contra tudo e contra todos, do Amor verdadeiro.
Durante a festa de São João, muitas raparigas “namoradeiras” andam à volta de uma estátua de S. Longuinho, no Bom Jesus, ao mesmo tempo que proferem determinadas orações com o objetivo simples de apressarem o seu casamento.
2.2. A Estátua
No cimo do Bom Jesus, encontra-se a estátua de S. Longuinho, datada do ano de 1819. Esta estátua equestre, em pedra de granito sobre um pedestal, do escultor Pedro José Luís, é única em Portugal e muito rara no mundo.
Por isso, acreditando ou não em lendas e histórias antigas, se quer tanto casar já sabe: dê umas “voltinhas” na estátua do Longuinhos.
3. O Abade de Priscos tem a sua história
Segundo reza a lenda, o Abade de Priscos – ou Manuel Joaquim Machado Rebelo de seu nome – era conhecido na freguesia de Santiago de Priscos pelos seus grandes dotes no que diz respeito a engomar roupa, costurar e bordar.
Porém, o que o tornou verdadeiramente famoso, foi o seu dote culinário, tendo sido considerado um dos maiores cozinheiros do século XIX. Esta distinção deve-se ao particularmente à sua obra culinária mais famosa: o Pudim Abade de Priscos, ainda hoje peça integrante da maior parte dos cardápios dos restaurantes Minhotos.
Foram diversos os acontecimentos que contam como o Abade transformava, através de uma perícia e perfeição inigualável, as suas refeições em pura magia. Caracterizadas como uma explosão de sabores, diziam-se ser resultado da panóplia de temperos que acompanhavam o Abade na sua “maleta” secreta.
Exemplo disso, foi o episódio vivido a 3 de outubro de 1887. Nessa data, o Abade de Priscos foi convidado para preparar o banquete real, na Póvoa de Varzim, para receber a visita de El-Rei D. Luís e e a sua família. O desempenho do Abade foi tão excecional que o Rei mandou chamá-lo para o conhecer e saber qual a composição daquele prato delicioso e único.
O Abade, com uma resposta inesperada, sorriu e afirmou “Era palha, real Senhor!”.
Isto desencadeou o espanto de todos os presentes e a pergunta incrédula do Rei: “Palha? Então dá palha ao seu Rei?”.
Mais uma vez, de forma misteriosa, o Abade esclareceu: “Majestade, todos comem palha, a questão é saber dá-la…”.
Conclusão
Braga é uma cidade muita antiga e muitas mais estórias haverá. Chamamos-lhes estórias porque, em rigor, alguns pormenores poderão estar distorcidos, fruto da transmissão oral e escrita, muitas vezes, pouco rigorosa. Contudo, não é esse o verdadeiro intuito da transmissão destas estórias pois, mais do que exercícios de rigor, são manifestações culturais que refletem o património imaterial de uma população.
E isso, é aquilo que pretendemos celebrar.
Para quem visita pela primeira vez a cidade, não deixe de passar por estes locais e provar o pudim. Temos a certeza que sairá mais rico culturalmente e, quem sabe, com um casamento ao virar da esquina.