Situação prosaica: uma mulher, vinda do interior do apartamento onde vive, chega a um espaço dele. É uma mulher de meia-idade. Evidencia um semblante entre o inexpressivo e o severo – traços de amargura. Traz entre os braços um cesto com roupa por passar; depois instala a tábua de passar, liga o ferro de engomar…. Começa a cumprir a rotineira tarefa doméstica. Subitamente, dá conta que no prédio defronte, num apartamento até então desabitado, se instalou uma nova inquilina. Tudo muda.Começa então entre elas uma conversa – na verdade, um solilóquio – na qual, sob múltiplos aspetos, se evidencia a relação homem/mulher, hoje como no passado, uma questão de antropofagia.
Diz Unamuno que o homem não pode viver senão de fome. A mais viva expressão de amor é “Eu comia-te!” (…) Só que hoje já não comemos as carnes; comemos as almas! É desta matéria, na sua abrangência real e metafórica, que falará o espetáculo, aliás, na linha do desafio lançado por Franca Rame: Há dois mil anos que choramos. Vamos agora rir, rir de nós próprias.
Autores: Franca Rame e Dario Fo | Encenação: Luís Vicente | Cenografia: Luís Mouro | Interpretação: Antónia Terrinha | Desenho de luz: Fernando Sena | Produção: Celina Gonçalves